Cansada das críticas nunca retrucadas, abaixei meus óculos e ajustei o cruzamento das pernas. Resolvi convocar todas as sombras das pessoas que me criticam por eu levar em consideração o seu passado, pois, lembrei-me que elas nunca pararam para me perguntar o porquê que eu o levo em consideração. Então convoquei-as e delicadamente pedi licença para falar:
Queridas sombras,
Vejam bem,
Se eu esquecer o passado de vocês e olha-las a partir de agora,
Que nome vocês se dariam?
[todas as sobras começaram a entrar em alvoroço e zombar de mim]
Vejam bem, por favor, estipulem seu começo, vocês são como uma página em branco novamente, então ponham como título o seu nome...
[as sombras se entreolharam com ar de desdem, porém, atenciosas]
Apercebam que, esquecido ou apagado o passado, eu não sei nada sobre vocês,
não sei seus nomes,
suas primeiras falas ainda não foram balbuciadas,
apagado o passado vocês ainda não falaram nada!
[as sombras unissonante disseram: Que loucura Roberta!]
Roberta?
Como vocês sabem meu nome?
Se nem têm os seus ainda?
Já nos fomos apresentados?
[incrédulas, as sombras atentamente me observavam]
É impossível apagar o passado de uma pessoa, o presente por si só é fálido nele mesmo, acaba no momento em que se inicia. Contem, por exemplo, de 1 a 10... Antes de chegarem no 5 o 1 já é passado. Na verdade, o que muitas pessoas querem apagar são certos momentos aos quais consideram como conturbados e não apagar o passado.
Apagar o passado é apagar a sua vinda a cá na terra, é apagar as fotografias da infância, os sorrisos dos aniversários, o primeiro beijo mal dado, acompanhado de nojo por não ser como na TV. É esquecer o jeito certo de encaixar a gaveta quebrada do antigo armário... Mas, as sombras que, um dia conseguirem apagar seus passados, por favor me procurem e digam:
muito prazer eu me chamo, Otário.
(com letra maiúscula, pois é nome de pessoa)
Com carinho,