quarta-feira, 28 de julho de 2021

Antes de ontem, minha amiga que acabara de perder seu filho, estava olhando para o céu quando me fez a seguinte pergunta: "Roberta, você acha que ainda há luz para mim?". Seu questionamento ecoou em meu cérebro e ficou vibrando em todo o meu corpo, e, em questão de segundos, dei a ela uma resposta ao qual não me recordo na íntegra, mas que achei satisfatória. Logo em seguida, saí de sua casa e fui em direção a minha, coisa de 10 segundos, trazendo sua indagação comigo, que ficou vibrando em mim. Já no meu quarto, várias outras perguntas invadiram a minha cabeça, coisas do tipo: "Uma mãe acha a luz mesmo depois de perder um filho?", "Dá para encontrar luz nas lembranças, as quais jamais quereríamos que virassem momentos longínquos?", "Em que momento a luz aparece e dissipa a agonia?". Percebi que em todos os questionamentos a palavra luz se repetia e, de certa maneira, aquilo me inquietava... De repente, em uma fração de segundos, um feixe de luz entrou pela janela do meu quarto. Sobressaltada, cerrei os olhos e pus meu corpo em defesa, enquanto várias imagens começaram a aparecer entre a luz, tudo ficou tão claro que os meus olhos ficaram marejados, na tentativa de se acostumar com o fulgor. Foi nesse momento que um brilho cintilante começou a brotar do teto e escorria pelas paredes do meu quarto, em cada pedaço de luz eu via vários fragmentos do sorriso do filho de minha amiga. Pablo, seu filho, tinha um sorriso impressionante, cheio de dentes grandes e bonitos, que agora escorriam entre as minhas paredes, seguido de várias letras desordenadas que caíam como uma chuva de meteoros. Algumas palavras começaram a se formar das letras, e, a primeira delas foi "semente". Logo depois, a palavra "fé" surgia e brilhava. Em seguida, em uma questão de segundos, formou-se a palavra "esperança", e, por último, vinha brotando do teto a palavra "eternidade". Estas quatro palavras ficaram circulando em torno do sorriso de Pablo e dançavam um baile de letras pomposo e cheio de luz, parecia que faziam uma apresentação, que estavam em um espetáculo. Aos poucos, vi soltar letra por letra de cada uma das palavras, tomando todas uma única direção. Atônita, limpei os olhos e acreditei que o espetáculo havia chegado ao fim, quando, de repente, as letras começaram a voltar, num misto de confusão e exaltação, todas embaralhadas procurando um local para se fixarem, tipo quando abrem a porta de um espetáculo e as pessoas buscam os melhores assentos para assisti-lo. Foi aí que cada letra começou a se alocar em lugares exatos e ali permanecerem, algumas iam embora enquanto outras achavam seus devidos lugares e assim formaram frases, as quais escorriam pela parede do meu quarto. Fragmentos do seu sorriso apareciam, e a sensação que eu sentia era de estar em um daqueles dias em que o céu encontra-se extremamente limpo, com um sol radiante que nos toma de conta e enche-nos de energia, fazendo com que sintamos vontade de ir à praia. Uma frase cintilante se formou como resposta à primeira pergunta que surgiu na minha cabeça, e, nela, em letras garrafais, estava escrito: "A luz está em você, foi você quem o gerou". A segunda frase apareceu logo em seguida como um letreiro gigante e dizia: "Tudo foi real. Só há lembranças do que continuará a existir pela eternidade/Nada será apagado". E a última frase seguiu como uma manchete de jornal com o seguinte dizer: "Você é mais forte do que imagina"... Logo após, todas as palavras foram se embaralhando novamente e indo embora, uma imagem do sorriso de Pablo apareceu e inundou o meu quarto, clareando tudo como um relâmpago, tamanha sua luz. Suavemente, seu sorriso foi seguindo o mesmo percurso das palavras e indo embora, enquanto os meus olhos incrédulos acompanhavam o trajeto da luz que se esvaia pela janela do meu quarto. A única reação que tive foi apenas limpar as lágrimas e começar a escrever, com as mãos trêmulas eu redigia incessantemente em uma folha de papel A4 tudo o que vira, com a certeza de que aquele texto não era um Poema de Quarto qualquer, pois ele possuía um único destinatário: Francisca dos Santos Pinheiro da Cruz, sua mãe.

Com carinho,

Roberta Laíne, via Poemas de Quarto.

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