segunda-feira, 17 de outubro de 2022

O que você faria se o teu orgulho não existisse, João?
Acabrunhado, João olhou pelas frestas da persiana, enquanto o seu olhar fugia para bem longe. Quis falar, mas a palavra ficou presa na glote, então balbuciou algo ininteligível. Depois disso, numa tentativa de se recompor, cruzou as pernas, e trouxe de volta o olhar que estava longe, concentrando-o no tamborilar de seus dedos e, depois, na caneta sobre a mesa, a qual começou a girar. 

“Nada”

Foi o que disse ao parar bruscamente os movimentos sobre o objeto. Mas a palavra saiu tão vazia e oca, que o fez se arrepender de não ter pegado a gripe de sua tia, só para ter ficado em casa naquela manhã. Segundos depois, João descruzou as pernas e saiu lentamente para a sua sala. Enquanto pegava seus pertences, em sua mesa, pensou no fato de nunca ter ido ao supermercado com o seu pai. Em seguida, pensou também, no pedido de namoro que não fez ao rapaz que amou, na adolescência. Lembrou-se da carta que escreveu, pedindo desculpas, ao seu ex-melhor amigo, a qual estava guardada em uma caixa de sapatos há 10 anos e nunca foi enviada. Sentiu o peito arder, ao recordar da mensagem de WhatsApp, enviada por sua madrinha, convidando-o para ir à praia, mas que nunca a respondeu e, agora, seria impossível, tendo em vista que a mulher havia falecido há 9 meses. Recordou do feriado de carnaval, em que estava doente, mas não conseguiu ligar à sua mãe pedindo ajuda, o que resultou em uma das piores noites de sua vida. Por fim, sentiu o gosto salgado de uma lágrima, que cruzou-lhe os lábios, no momento em que pronunciou em voz baixa:

“Eu teria sido feliz”

Apagou as luzes da sala e nunca mais voltou. 

Com carinho, 

- Roberta Laíne.


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