sábado, 30 de outubro de 2021

"Há um passado no meu presente"

Há poucos dias, fui para mais uma sessão de terapia que iniciei recentemente, e o tema do encontro foi Cássia. Acho que, passe o tempo que passar, sempre será difícil falar sobre ela. Inclusive, fiquei meio mal depois, mexer nessa zona é sempre bem desconfortante para mim. Narrei o que pude, mas sempre com a sensação de que poderia mais, muito mais. No meio da coisa toda, algo chamou a minha atenção. No final da sessão, já com a visão turva por conta das lágrimas, escutando em segundo plano a terapeuta falar que não foi culpa minha, que havia sido uma escolha dela e, ao contrário do que eu achava, eu havia feito parte de momentos felizes da sua vida... Quando de repente uma sentença vazia e incolor saiu de minha boca: “Eu queria não tê-la conhecido”. Até agora isso está ressoando aqui dentro do meu peito, está batendo em minha caixa torácica, conforme a pulsação do meu coração. “Eu queria não tê-la conhecido” foi muito áspero, severo, sem brilho. Isso me machucou, machucou muito. Querer não tê-la conhecido é muito dolorido, e o mais engraçado de tudo é que, eu não falei isso por egoísmo, ou pelo fato de querer abster-me de toda a dor e sofrimento que permeou a sua morte. Não, não é nada disso. Na verdade, eu não queria tê-la conhecido pelo severo sentimento de culpa, pela claustrofobia que é pensar que tive influência sobre sua escolha, que se, caso ela estivesse com outra pessoa, que não fosse eu, poderia estar viva e feliz. Eu queria tanto que ela estivesse viva... Eu queria tanto que ela estivesse viva e feliz. Eu queria tanto que ela estivesse. Não como ela estava, Cássia não era feliz, por isso queria que estivesse viva e diferente do que era, como nunca a vi. Queria ela tivesse vontade de viver, com determinação para correr atrás de seus sonhos, queria que Cássia tivesse sonhos. Queria que ela soubesse lidar com as dificuldades que estavam à sua volta. Que seus problemas familiares e tantos outros, como traumas e feridas mal curadas, tivessem menos poder sobre ela, e que conseguisse conseguir. Mesmo morrendo de ciúmes, eu preferiria um zilhão de vezes que ela estivesse, nesse exato momento, feliz nos braços de outra pessoa, e sobretudo viva. Não só respirando, queria que ela estivesse viva, respirar todo mundo respira, respirar ela também respirava, mas não estava mais viva, por isso eu queria muito que ela tivesse recuperado a capacidade de viver, não por ninguém, mas por si, por acreditar na alma esplêndida e foda que era. Infelizmente nem tudo o que queremos depende só de nós, mas, se dependesse de mim, eu gostaria de que ela estivesse aqui, em paz, feliz, e sobretudo viva.

Com carinho, 

Roberta Laíne.

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